Debaixo dos panos
Por mais que eu fique feliz ao ver os jovens se organizando e lutando por seus ideais, o que vi na escola Tereza Francescutti me deixou um tanto quanto desconfiado, para não dizer que me deixou extremamente preocupado. Os alunos ocupantes estavam de fato organizados, embora ainda vissem a ocupação com certa ingenuidade. Quando comentaram que tinham autorização por escrito dos pais para que os menores permanecessem à noite na ocupação ficou claro para nossa equipe de reportagem de que eles não percebiam que nenhuma autorização era cabível naquela situação. Se a ocupação é uma transgressão, ela não deveria estar atrelada a autorizações e acordos.
Mas isso apenas me mostrou que eles eram ingênuos e facilmente manipuláveis por ditas autoridades. O que me preocupou de fato foi ver que isso não era apenas uma possibilidade, mas sim uma realidade.
A ocupação foi claramente orquestrada por forças externas, as bandeiras da Ubes e do Cpers hasteadas nos mastros da escola durante a ocupação evidenciavam isso. Só que quando os estudantes deram os nomes das pessoas de dentro do sindicato dos professores que estão por trás da ocupação, o orgulho inicial que senti ao ver uma geração jovem lutando por seus direitos foi quase que totalmente substituído por uma desesperança. Afinal, as coisas não mudaram tanto. As antigas forças políticas continuam manipulando a população. Respeito, e muito, as reivindicações dos professores e do Sindicato, mas não consigo gostar da ideia de que atuando nos bastidores, debaixo dos panos, o CPERS tenha conseguido fazer com que as reivindicações dos professores sufoquem as dos alunos.
Fora do padrão
Na última semana visitei todas as três escolas ocupadas de Canoas: Rondon, Tereza e Visconde. O que salta aos olhos é a organização similar, quase sincronizada, que só é obtida através de intercâmbio ou orientação detalhada. Organizados, os jovens distribuem tarefas, programam atividades e ações. Isso permite algo inusitado: o interesse.
O processo tradicional de educação atual é, combinamos, no mínimo chato. São nove anos de ensino fundamental e mais três de médio – isso para aqueles que não reprovaram – sentados em fileiras, uns atrás dos outros, com a única função de ouvir e copiar aquilo que o professor diz. A funcionalidade das ocupações mostra, entre outras coisas, que este modelo faliu.
Embora seja visivelmente orquestrado por movimentos com interesses próprios como a Ubes, a UJS, a UEE Livre e o próprio Cpers e seja realmente perigoso tal atitude – e as entidades devem assumir a responsabilidade pelo resultado dessa história – a atual situação ensina como manter os alunos interessados, como dar a eles o protagonismo que é necessário, uma vez que todo o sistema educacional é visando a evolução dos alunos.
A ocupação é o fora do padrão. É o diferente. Muitos experimentam sua primeira ação política e estão entusiasmados com isso. Outros possuem experiência o suficiente para manipular os colegas sobre o que ser contra e o que ser a favor. Mas é uma realidade e está aí. A falta de aulas e a chegada do Enem é outra realidade que mais dia ou menos dia haverá de ser encarada com ou sem as tão pedidas melhorias estruturais nas escolas construídas há décadas que hoje estão caindo aos pedaços.