
Jorge Luis de Souza. Foto: Bruno Lara/OT
Bruno Lara
O dia 24 de setembro de 2014 mudou a vida de Jorge Luis dos Santos para pior. Atualmente com 51 anos de idade, o cidadão canoense se encontra em situação de rua em função de negócios mal sucedidos. Jorge procurou a redação de O Timoneiro para expor a dificuldade que vive, principalmente em relação ao Albergue Municipal.
Nem opção, nem briga com a família. A morte de sua mãe foi a gota d’água para que sua vida mudasse para pior. Com o ocorrido, mudou-se com a mulher para Balneário Pinhal, onde comprou uma casa. Embora um ótimo destino no verão, o litoral não apresenta demanda de serviços no inverno, o que obrigou o radialista amador, vigilante, taxista e chapista Jorge a se mudar novamente em busca de trabalho. “Eu fiz o reconhecimento de tropas do Fernando Henrique (ex-presidente) e do Brito (ex-governador) que uns foram para Uruguaiana e outros para Santa Maria”, lembra.
Nesta mudança comprou um terreno em área da Marinha, e com medo de ser despejado, mudou-se novamente. Mais um péssimo negócio. O terreno era de herdeiros e o beneficiado ofereceu R$ 16 mil para que saísse ou perderia tudo. E foi o que fez. “Em resumo, meu dinheiro, metade investi mal e a outra metade me roubaram”, salienta.
Albergue
Em setembro do ano passado dormiu na rua pela primeira vez, experiência que não gostaria de repetir, mas o faz por necessidade, geralmente na praça do bairro Fátima. Assaltado por cinco vezes resolveu procurar um lugar seguro e chegou até o Albergue Municipal. “Mas lá é possível ficar quatro dias, apenas, e depois fora por quinze dias”, informa. Na noite de terça-feira, 7, foi impedido de entrar no Albergue com a justificativa de que o mesmo estava lotado. “Me admiro muito uma assistente social tomar uma atitude desta: Não, não dá pra ficar (disse ela)”. Então foi dormir em frente à Prefeitura. “Estava sobrando camas. Tinha cinco camas. No quarto 2, que é o que eu estava, tinham cinco beliches. No quarto 3 mais dois. Eu entro em contato com os colegas lá”, conta. “Eles vão ter que me matar para que eu cale a boca. Eles pegam o pessoal lá de Porto Alegre e socam na Mathias”, conclui.
“Quero dar um grito e ninguém quer me escutar”
Jorge procurou a Prefeitura, que lhe fez mais promessas. A proposta era a construção de um lugar para atender os moradores de rua. Calejado, rejeitou a ideia. “Antes de vocês quererem fazer coisa para morador de rua, que vocês não vão conseguir, vocês terminam o que estão fazendo. Aquele Albergue está virado em um lixo”, repudiou e fez questão de lembrar Jairo Jorge (PT). “Falei para o Prefeito. O Sr. vá lá ver se o sr. coloca um inimigo seu para dormir lá”.
Segundo ele, ocorrem brigas na instalação em função de alguns entrarem alcoolizados. “Esses tempos brigaram e quase se mataram. Eu estava lá. Eu vi”, afirma. Jorge discorda que a atual administração se esforce para mandá-los para o Albergue. “Eles dizem que querem mandar o pessoal da rua para o Albergue, mas o pessoal não quer ir. Eu quero ir e eles não querem deixar. Quero dar um grito e ninguém quer me escutar”, lamenta, mandando o recado “Meu título é de Canoas. Para votar eu sou cidadão. Para votar me procuram”.
Mais uma oportunidade
Em busca de emprego, espalhou diversos currículos pela cidade “me inscrevi no Banco de Oportunidades, mas a assistente social disse que para estar lá precisa estar trabalhando. Tu acha que eu vou pegar uma pistola, chegar em uma firma, botar na cabeça de uma pessoa e dizer: Tu me dá um emprego agora?. Isso não é assim. Tem que avaliar, ver o currículo, se tu te encaixa no perfil. Não se enfia nada goela abaixo. Como é que eu, morador de rua, vão cobrar para que resolva as coisas em um dia se eles têm quatro anos e não resolvem? Essa lambança, esculhambação de Albergue sucateado”.
Conta que pediu para o Prefeito uma moradia, provisória, mesmo que seja pagando aluguel. “Me dá uma maloquinha. Tem tanta área aí. Uma casinha de 5x40m por 5x40m, me dá só a casinha vazia que eu vou à luta para botar umas coisas dentro. Eu não quero uma maloquinha no meu nome. Pode ser no nome da Prefeitura. Eu só quero uso e fruto, quando eu morrer volta para vocês. Eu não estou de malandragem, eu não quero nada dado. Se eu trabalhar até pago. Não to pedindo nada dado, só condições de me manter”, implora.
Efeito da publicidade na pele
“Tem que esclarecer para a população ou só aparece as coisinhas bonitinhas. Eles, no jornal deles (Jornal da Prefeitura) botam só coisinha bonitinha. Fizeram um monte de escolas, monte disso e daquilo. Botaram um trono para Jesus sentar e o pessoal atirado na rua, catando coisa do lixo. Até então eu acreditava neles. Quando eles fizeram o que fizeram ontem, quando eu pedi para entrar e recebi um não, eu desisti” conclui.
Jorge Luis de Souza. Foto: Bruno Lara/OT
O que diz a Prefeitura
Segundo a Secretaria de Comunicação do município, o Albergue conta com 11 servidores e que lá são investidos R$ 100 mil por mês. A estrutura atende entre 50 e 60 pessoas por dia. No máximo, 12 mulheres e de 38 a 48 homens. Lá são oferecidas aos moradores de rua refeição, banho, higiene, vestuário, das 16 horas até as 07 horas. Durante o dia, o público pode procurar o Centro POP (Centro Especializado em Atendimento a População em Situação de Rua). A responsável pela estrutura é a coordenadora Stela Maris da Silva Rosa.